Narciso's Lake

sábado, abril 19, 2008

Ninguém

A rua estava fria. Era sábado ao anoitecer mas eu estava chegando e não saindo. Passei no bar e comprei um maço de cigarros. Vinte cigarros. Eram os vinte amigos que iam passar a noite comigo.

A porta se fechou como uma despedida para a rua. Mas a porta sempre se fechava assim. Ela se fechou com um som abafado e rouco. Mas era sempre assim que ela se fechava. Um som que parecia o adeus de um condenado. Mas a porta simplesmente se fechara e ela sempre se fechava assim. Todos os dias ela se fechava assim.

Acender o fogo, esquentar o arroz, fritar um ovo. A gordura estala e espirra ferindo as minhas mãos. A comida estava boa. Estava realmente boa, embora tenha ficado quase a metade no prato. Havia uma casquinha de ovo e pensei em pedir-me desculpas por isso. Sorri com esse pensamento. Acho que sorri. Devo ter sorrido. Era só uma casquinha.

Busquei no silêncio da copa algum inseto mas eles já haviam todos adormecido para a manhã de domingo. Então eu falei em voz alta. Precisava ouvir alguma coisa e falei em voz alta. Foi só uma frase banal. Se houvesse alguém perto diria que eu estava ficando doido. Eu sorriria. Mas não havia ninguém. Eu podia dizer o que quisesse. Não havia ninguém para me ouvir. Eu podia rolar no chão, ficar nu, arrancar os cabelos, gemer, chorar, soluçar, perder a fala, não havia ninguém para me ver. Ninguém para me ouvir. Não havia ninguém. Eu podia até morrer.

De manhã o padeiro me perguntou se estava tudo bom. eu sorri e disse que estava. Na rua o vizinho me perguntou se estava tudo certo. Eu disse que sim e sorri. Também meu patrão me perguntou e sorrindo eu disse que sim. Veio a tarde e meu primo me perguntou se estava tudo em paz e eu sorri dizendo que estava. Depois uma conhecida me perguntou se estava tudo azul e eu sorri e disse que sim, estava, tudo azul



(Luiz Vilela)




Assim as pessoas me perguntam e eu sempre respondo com um sorriso que está tudo bem, que está tudo em paz, que está tudo azul, ainda assim estou sozinha e tenho que me desculpar para mim mesma por alguma coisa que tenha saido errado em minha aventura gastronômica solitária, por que não tem ninguém e eu poderia até morrer que ninguém veria... Será que quero viver sozinha? essa resposta eu tenho e ela é lacônica...


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Sou, e o que sou não saberia dizer, sou muitas coisas e nenhuma ao mesmo tempo, me defino pela dualidade. Dualidade esta que me permite mobilidade, e sendo móvel não pertenço a ninguém e nem a lugar algum... e sou mutante, e me movo de acordo com minhas vontades, e estas por sua vez são também mutantes, de forma que desejo muitas coisas, para de repente nada desejar... sou um ser humano, o que por definição me faz um ser angustiado e dividido... mas isso poucos conhecem, o que muitos sabem é que eu rio, e danço, e brinco despreocupadamente com a vida... mas estes desconhecem a ferida que carrego...

terça-feira, junho 05, 2007

Devi Shanti

Buscas

Durante muito tempo busquei amores que eram como o fogo, que queimassem e alardeassem sua passagem, no entanto descobri que esses amores eram mesmo como o fogo e possuíam a beleza indomável deste, mas possuíam também todo o poder destrutivo que o fogo tem, por que o fogo serve apenas para olhar, desconhece barreiras e destrói o que se puser a sua frente. Hoje eu busco amores como a água, amores perenes e belos, que sejam adaptativos, que sejam calmos, flexíveis e compreensivos. Acho que finalmente amadureci, e deixei de buscar o inatingível, e de tentar reter o inapreensível, o que é uma busca adolescente, que é bela e intensa, mas efêmera. Hoje eu quero a calma das coisas que crescem devagar e tranqüilamente e que ficam, hoje e prefiro a superfície clara e calma do lago à angústia da queimada.

domingo, julho 02, 2006

Augusto dos Anjos

VERSOS ÍNTIMOS

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão — esta pantera —
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

terça-feira, maio 16, 2006

Pra Vocês Meninos

Estava pensando com os meus botões, imaginando o quanto, vocês meninos, estão perdidos quando o assunto é mulher, e pensei que talvez pudesse escrever alguma coisa que possa clarear suas mentes nesse ponto, muito embora esse seja um assunto amplamente discutido em todos os lugares, e existam verdadeiros compêndios para tentar elucidar as mentes masculinas (e femininas) acerca do sexo oposto. Bom na minha opinião a coisa é mais simples do que se possa imaginar, basta um pouco de sensibilidade e atenção a pequenos sinais para tudo dar certo. É como quando a gente está se iniciando nos ritos do amor, e fica atento a pequenos gemidos e arquejos que nos demonstram que atingimos o ponto, assim, basta ver o brilho nos olhos e o sorriso radiante para saber que você marcou um ponto com a pequena. É extremamente importante que ela se sinta amada e única, que se sinta parte integrante da sua vida, que se sinta segura. E apesar disso tudo parecer muito complicado, na verdade não é. Apresente-a para seus amigos, para a sua família, convide-a para programas que você gosta de fazer (mesmo que ela não possa ir), assim ela se sentirá parte da sua vida, e se sentirá segura, pois perceberá que as pessoas a conhecem e sabem o quanto você a ama, e ela poderá mostrar para os que te amam que ela é uma garota legal que te ama e se importa com você. Jamais a deixe se sentir excluída de sua vida, isso é um passo para ela se sentir só mesmo estando acompanhada o que fará com que ela fatalmente pense em terminar com você. Essa é a parte mais importante para fazer com que ela se sinta segura e amada. Mas se você quiser ir adiante aqui vão outras dicas. Presenteie, não precisa ser caro, não precisa nem custar nada, mande um e-mail, uma mensagem de madrugada só pra dizer o quanto você a ama e o quanto ela é importante para você. Dê flores, mesmo que roubadas do jardim do vizinho, passeie de mãos dadas no parque, leve ela pra comer algo que você sabe que ela gosta, dê atenção aos seus problemas, às suas chatices, às suas piadas sem graça, às suas brincadeiras. Se perceber que ela está à beira das lágrimas a abrace, e se não houver nada para dizer fique calado, mas a estreite no seu peito e deixe-a chorar até que ela lave toda a dor que está guardada, depois pergunte o que há, e se ela disser que não é nada acredite, pois mulheres têm dessas coisas, e às vezes choram sem motivo aparente, e tudo que elas precisam é de carinho e compreensão, mesmo que não haja nada para ser compreendido. Façam isso e tudo o mais que desejarem, surpreendam, digam a todo momento o quanto gostam, o quanto a acham linda, percam minutos embevecidos pelo brilho de seus olhos, olhem para ela como se estivessem diante de uma descoberta maravilhosa. Façam isso e colherão os frutos da sua semeadura, e ela os amará, e então vocês terão o maior de todos os presentes. Muito importante: sejam líricos, mas não percam o ar safado, e não deixem de demonstrar o quanto ela os excita e todo o desejo que sentem por ela, e pelamordedeus: TENHAM A PEGADA, pois homens perfeitos, muito bonzinhos que não mostram a que vieram acabam por perder para o cafajeste que fará tudo direitinho só para come-la, logo, façam tudo direitinho sem esquecer do detalhe de trata-la como se ela fosse o maior objeto de desejo de sua vida, sejam firmes quando abraça-la, beijem com firmeza alternando com carinho alternando com provocação, joguem ela na parede, chamem de lagartixa e tudo o mais. Daí vocês só precisam se preparar para colher os louros, pois a vitória será só de vocês.

quinta-feira, abril 06, 2006

Ternura


Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma...
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar extático da aurora.


(Vinicius de Moraes)


(...)

sábado, fevereiro 18, 2006

Mais uma de Neruda

Amiga, não morras.
Ouve estas palavras que me saem ardendo,
e que ninguém diria se eu não te dissera.

Amiga, não morras.

Eu sou o que te espera na estrelada noite.
O que debaixo do sangrento sol poente te espera.

Olho os frutos cair na terra sombria.
Vejo as gotas de orvalho dançando na erva.

Na noite o espesso perfume das rosas
quando dança a ronda das sombras imensas.

Sob o céu do Sul, o que te espera quando
o ar da tarde como uma boca beija.

Amiga, não morras.

Eu sou o que cortou as grinaldas rebeldes
para o leito selvagem fragrante a sol e a selva.
O que trouxe nos braços jacintos amarelos.
E rosas desgarradas. E papoulas sangrentas.

O que cruzou os braços para te esperar agora.
O que rompeu seus arcos. O que vergou suas flechas.

Eu sou o que guarda nos lábios o sabor de uvas.
Racimos esfregados. Mordidas vermelhas.

O que te chama desde as alturas brotadas.
Eu sou o que te deseja na hora do amor.

O ar da tarde vibra nos ramos mais altos.
Ébrio, meu coração, debaixo de Deus, cambaleia.

O rio desatado rompe às vezes a chorar
sua voz se adelgaça e se faz pura e trêmula.

Retumba, entardecida, a queixa azul da água.
Amiga, não morras!

Eu sou o que te espera na estrelada noite,
sobre as praias áureas, sobre as douradas eras.

O que cortou jacintos para teu leito, e rosas.
Estendido entre ervas, eu sou o que te espera!






quarta-feira, fevereiro 15, 2006

Solidão

Como definir o que é solidão??? solidão é muito mais que "estar só", solidão é "se sentir só", solidão é chorar num terminal de onibus às 15 pra meia noite de uma quarta pra quinta feira e não ter ninguém que possa te alcançar, ninguém para perguntar o que há, e aúnica cumplicidade possível é a da cachorra de rua que deita ao seu lado e suspira, um suspiro fundo que parece carregar tanta tristeza quanto você.

Solidão é entrar em casa no escuro, passar esbarrando nas cadeiras sem ter que se preocupar em acordar ninguém, é entrar na cozinha e encontrar a louça mofando na pia, é entender anos mais tarde a profundidade de uma crônica lida na adolescência (bons tempos os de adolescente, não é de admirar que tantos não queiram deixá-la pra trás).

Solidão é esperar o telefone tocar, horas, dias, e ele se recusar. De repente: Trimmm... Alô, aqui é da São Judas... fucking shit!!!! não!!! não é esse telefonema que eu espero...

Solidão é ter os braços abertos e o coração pulsante e não haver ninguém, ninguém pra abraçar, ninguém pra amar...

Ficaria horas dizendo o que pode ser a solidão, ainda assim não conseguiria, apenas esbarraria na solidão imensa em que me encontro, e na dor insuportável que ela trás consigo...